Escolha uma Página

Por Carpinejar:

Você rasgou a primeira página de meu livro. Rompeu a costura invisível da lombada.

Num único gesto, zombou de todas os bibliotecários, de todas as catalogações, de todas as emoções encadernadas. 

Tirou um pedaço do papel à toa. Sem santidade. Sem zelo. Com uma urgência imperdoável.

Arrancou para anotar seu e-mail e nome.

– Toma –, e me entregou.

Não estava em apuros. Pelo contrário, pedia sequestro.

Um bilhete para que desesperasse sua vida regrada.

Hoje revi seu nome no bolso da calça.

Seus olhos ciganos ainda cochichavam nas letras tremidas.

Não há melhor folha de rosto do que seu corpo sobre o meu.

O livro nunca pousará na estante. Ficará na cabeceira da cama, na mesa da sala, uma escrita penada pela casa.

Nosso livro agora é anônimo.

Não teria capacidade de consertá-lo e reduzir o que vivemos.

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