Se tu me perguntares sobre as coisas que eu não suporto, frieza é uma das primeiras da lista.Esse é o sentimento que mais me choca nas pessoas, a incapacidade de sentir.Não falo do terrorismo nem dos crimes hediondos. Falo de mim e de ti. Que horror a fraqueza? Falo em seres desabilitados para o amor.Tu não chora? Tu não ama? Tu não te comove? A primeira cena que me vem a cabeça é uma foto tirada por Kevin Carter em 1993, de um urubu esperando uma criança morrer para poder come-la.Foto que ganhou o Prêmio Pulitzer em 1994 e publicada pelo The New York Times. Um ano depois o fotógrafo, em profunda depressão, suicidou-se. Não vou postar a foto pois acho realmente uma imagem triste, e não é isso que quero te fazer sentir. Não, quero te falar sobre a incapacidade de sentir. Que pessoa como eu e tu, tiraria uma foto ao invés de ir lá e abraçar aquela criança com o todo amor que existe dentro do coração, abraçar apertado como se nunca fosse largar, e como se ela nunca fosse se sentir só. Sim, era o trabalho dele, mas recompensa foi a sua própria morte, e porque? Porque somos humanos caríssimos, eu e tu, e todos nós. Triste é a pessoa que não se comove com o sofrimento do próximo. Que as causas humanas não convencem.Eu fico chocada com a frieza das pessoas, com a falta de humanidade, de carinho com o próximo.Se você soubesse o quanto faz bem um simples elogio, um toque, um abraço, um sorriso ou até um simples aperto de mão.. Um olhar de aprovação que seja.. É disso que as pessoas são carentes.Eu choro, eu me emociono com as pessoas, com suas histórias… Sempre. Não há Cristo que me faça parar de sentir. Eu sinto o tempo todo, tudo e todos, e até hoje não compreendo a frieza do ser humano em determinadas situações.
Essa semana eu vi uma pessoa caída no chão… Era um morador de rua, mas era uma pessoa, era um ser humano… Ele estava li, como se o mundo não enxergasse que ele precisava de ajuda.
Eu não tenho nojo de ajudar alguém, mas eu tenho nojo de quem não faz nada, de quem abre a boca todos os dias pra falar de humanidade, e nessas horas passa reto, chuta, finge que não vê.
Isso é frieza, falta de sentimento. É tão bonito falar, escrever, mas fazer, ajudar faz bem, faz bem pro coração, pra cabeça… Eu jamais deitaria na minha cama tranquila se eu soubesse que eu poderia ter ajudado e eu não fiz.Sinto pena infinita do mundo decadente. Da humanidade suicida. Do tempo que acaba a toda hora. Da vida que se devora. Do meu próprio medo ridículo de não poder salvar o mundo.Há chances? Somos a amostra da vida e, se não podemos, ninguém pode. Se não podemos chorar ou não chorar pelo que é de verdade, ninguém mais pode. Ninguém conseguirá. Deus colocou apenas em mim e em ti as razões pra ir além. Nós as conhecemos e nós as ignoramos: optamos por chorar e não chorar pelo que somos. Mas somos humanos, se não nos ajudarmos, quem fará? Frieza e a incapacidade de sentir… os piores defeitos que alguém pode ter.
Lindo texto!Realista,puro e sincero! Parabéns!!!!
Gostaria de levantar um debate, dentro desse mesmo tema, visando perceber aquelas pessoas que têm o coração contectado com a realidade, que de fato sentem a dor da realidade e os prazeres da ingenuidade. Mas por algum motivo aparentemente desconhecido elas não conseguem deixar esse sentimento fluir pelos seus corpos e expurgar as impurezas que vão acumulando ao longo da vida. Quem disse que não choram? Quem disse que não amam? Choram para dentro! E não é que não amem, mas talvez não saibam como amar, ou então amam de um modo imperceptível aos seus olhos. Seja como for, todos saem machucados e com cicatrizes. Que bom! Assim saberei que minha vida não passou em vão.
Olá, Beta Lotti!
Primeiramente fiquei impressionado com sua escrita, é tocante, reflexiva e refinada. Parabéns!
Sobre o comentário do Marcelo, realmente não creio que sentir tristeza, ter dor, cicatrizes é necessariamente a constatação que nossas vidas valeram a pena. Parece-me muito mais o efeito de criar, de refletir e, eventualmente, realizar algo, o verdadeiro intuito de estarmos nesta aventura dolorosa.
O texto da Beta levanta uma questão bem profunda: por que, muitas vezes, ficamos inertes ao sofrimento alheio? Isto quando não sentimos até uma certa satisfação em ver um fato triste, como se a tragédia do vizinho nos compensasse da nossa própria pobreza de espírito.
Noutro dia, aqui no centro de São Paulo, deparei-me com vários garotos pedintes e mendigos. Eles vieram em minha direção e pediram dinheiro; até escrevi isto no meu blog. Fiquei olhando os garotos irem embora, os adultos sem mariores perspectivas em suas vidas; mas, ao contrário da querida Beta, não fiz nada – apenas os observei e fiquei pensando em como seria a vida deles nas ruas.
Eu não sei sequer se havia ficado triste com aquilo, tal a acomodação de imagens horríveis que temos por estas bandas “afrancesadas” do território brasileiro. A única coisa que fiz foi escrever o texto, nada mais. Por que? Não sei explicar.
Sempre que vejo um homem dormindo nas calçadas, penso em ajudá-lo, mas, no entanto, nada faço. Sinceramente, também não creio que fique perplexo, fico apenas constrangido em ver uma pessoa igual a mim sem chance alguma de levantar-se na vida.
Também não culpo o governo, talvez a sociedade. Em outros momentos revolto-me. Mas sei que meu povo não tem identidade genuína, e tudo que faz é apenas copiar outros povos; desgraçadamente!
Devo confessar, do mesmo modo, que sobre a tal foto do urubu, não me contive e fui procurá-la na internet. Não é, de fato, uma boa imagem…
Parabéns pela ideia do blog, por escrever tão bem e claramente, por levantar questões reflexivas aos seus leitores e, principalmente, por demonstrar um pensamento tão criativo.
Beijo, querida Beta!